Ideias antigas

Fósseis, árvores, minorias, filhos e outras coisas fora de moda

Minha foto
Nome:

Apenas uma relíquia do Plioceno...

terça-feira, novembro 18, 2008

Desconstruindo Stephanes

AÍ VAI UMA BREVE análise de discurso do artigo do excelentíssimo senhor ministro da Agricultura publicado no domingo na Folha:

NÃO É preciso derrubar mais árvores na Amazônia para expandir a agropecuária brasileira, mas o mero congelamento da atividade não garantirá a preservação da floresta. Quem conhece a realidade local, bem distante de Brasília, identifica melhor as causas do desmatamento, originadas, principalmente, pela forma como a região foi ocupada, em uma época em que a própria lei estimulava a derrubada da selva.

A menos que o governo militar tenha estimulado o desmatamento nos anos 70 para plantar tulipas ou cocaína, ou para transformar toto o território amazônico numa imensa pista de pouso, e não para ocupar a região "pela pata do boi", o parágrafo não faz o menor sentido. A menos que Stephanes esteja fazendo distinção entre colonos da Transamazônica e sojeiros industriais, entre o zé do boi e o Friboi. Até onde eu sei, não há um limite de acreagem a partir do qual plantar comida ou criar gado passam a ser considerados "agropecuária".

Hoje, carvoarias, madeireiras, assentamentos, produtores rurais e a população que, literalmente, vive da floresta dividem, em vários níveis, a responsabilidade pela redução gradual do bioma. Porém, o Estado brasileiro merece, também, uma parcela de culpa por ter subestimado a importância da Amazônia no passado.

Onde mesmo estava o ministro nesse "passado"? Só pra saber.

O desafio, agora, é dimensionar o nível de responsabilidade de cada agente, adotando alternativas sustentáveis -e viáveis economicamente- que contribuam para o equilíbrio entre o homem e a natureza na região.

Leia-se: a culpa é do Incra. O agribísness não tem nada com isso.

Sob pressão externa, trata-se o desmatamento na Amazônia de forma emocional e nem sempre com base em dados confiáveis, que, por sua vez, acabam justificando medidas inconseqüentes.
Tampouco a estrutura tecnológica disponível é capaz de detectar as ocorrências em tempo real, a fim de reprimi-las.

Esta colocação é especialmente grave, porque aqui Stephanes volta a declarar com todas as letras que o Inpe não presta pra nada. Mente duplamente: um por dizer que o tratamento "emocional" dado ao desmatamento é motivado por pressões externas e não internas (meio como dizer que você entra em pânico não porque sua casa está pegando fogo, mas porque o seu vizinho está reclamando da fumaça); dois por dizer que não há tecnologia para detectar ocorrências em tempo real, ignorando instrumentos mais do que testados e aprovados, como o Deter, do Inpe, e o SAD, do Imazon. Repito aqui Sergio Rezende, ministro que cuida do Inpe: "quando estava caindo, ninguém questionava o dado".

Perdem-se meses discutindo a credibilidade das listas de desmatadores, quando, na verdade, desconhecemos os proprietários das terras. Aliás, a regularização fundiária da Amazônia é tão necessária que deverá merecer a criação de mecanismos próprios de acompanhamento, propostos pelo ministro extraordinário de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger, com aval do presidente da República.

É ótimo isso. Parabéns ao ministro por reconhecer o problema, que tanto beneficiou a seus companheiros até agora.

A legislação ambiental contribui, também, para engessar o debate sobre as melhores alternativas para a região. As leis mudaram, os critérios foram alterados, mas a realidade persiste. Por exemplo, até 2001, o Código Florestal obrigava os produtores a preservar 50% da área, e não 80%, como atualmente. Quem derrubou metade da propriedade passou a ser obrigado a reflorestar. Foi o que aconteceu com os assentamentos incluídos recentemente na lista dos maiores desmatadores da Amazônia.

Por "debate" o ministro quis dizer "abate", acho. Um lamentável erro de digitação.

Vale lembrar que a legislação ambiental contempla o território nacional, mas não considera as diferentes realidades nem as regiões nas quais a agricultura se instalou há décadas. Se as normas forem cumpridas à risca, praticamente a metade das propriedades rurais do Centro-Sul do país, no qual a agropecuária está consolidada, está ou estará fora da lei.

Sim, estão fora da lei. É por isso que Estados desmatados, como São Paulo, onde desde o século 19 não há mais perspectiva de retorno da floresta, discutem compensações ambientais. Na Amazônia e no Centro-Oeste ainda há o que salvar e o que compensar. Stephanes precisa tomar um café com Xico Graziano, que seria o último a defender a preservação das florestas, mas que parece estar realmente debatendo alternativas para compatibilizar agricultura e conservação.

Outra questão é a existência de duas Amazônias constantemente confundidas: a do bioma e a legal. Sobre o bioma amazônico, é simples: abrange a marca da floresta, embora registre outros sub-biomas. A Amazônia Legal é uma ficção geográfica, fruto da busca pelos benefícios fiscais da União por parte dos Estados vizinhos à floresta. Alguns destes com parte predominante dos territórios fora do bioma amazônico, sobretudo no Centro-Oeste, onde estão os biomas de cerrado, pantanal ou caatinga. Mesmo assim, a lei ambiental equiparou áreas desses biomas às da floresta amazônica, impondo-lhes, em grande parte, as mesmas restrições.

É uma enormidade isso o que o ministro diz, algo que só posso atribuir a má-fé. O mapa do IBGE a partir do qual se aplica o Código Florestal é o do bioma Amazônia, não da Amazônia Legal. Isso foi inclusive explicitado, a pedido de Stephanes, no decreto que condiciona o crédito na Amazônia ao cumprimento da lei ambiental - um decreto, aliás, que só poderia acontecer no Brasil. Diz mais ou menos assim: "Olha, Paranthropus, se você não deu cheque sem fundo e não está com nome sujo na praça, a gente te empresta dinheiro."

No que se refere ao agronegócio, repito, o Brasil tem alternativas para a expansão. Há estudos técnicos apontando para o uso preferencial de áreas agricultáveis, atualmente ocupadas por pastagens e que se encontram em vários níveis de degradação. E isso deve acontecer fora do bioma amazônico. Basta lembrar que a pecuária utiliza 200 milhões de hectares em todo o país para um rebanho estimado de 180 milhões de cabeças de gado.

Demorô! Por que então o seu ministério não fez o que lhe cabia no Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento, que era arrumar maneiras viáveis de ocupar essas terras degradadas? Por que gastou todo o dinheiro que recebeu para isso no combate à mosca da banana e à febre aftosa? Essas são ações "ambientais"?

Ninguém em sã consciência discorda que essa distribuição pode ser refeita e até incentivada pelo governo federal. Além do apoio à atividade econômica, a utilização correta das áreas degradadas evita a erosão e a desertificação, que levam ao assoreamento dos rios e ao empobrecimento do solo, respectivamente.

Favor consultar Roberto Rodrigues, que aparentemente esqueceu de lhe comunicar na transição que esta já é uma atribuição do MAPA.

A questão, porém, é que há áreas degradadas na região amazônica que poderiam ser recuperadas com culturas perenes, como o dendê e outras espécies nativas,

Ahá! Disse finalmente a que veio.

que, além de seqüestrarem carbono da atmosfera,

Pediria ao ministro que mostrasse os estudos apontando o seqüestro pelo dendê. E mostrando que ele é superior ao que é emitido por desmatamento.

recuperam o solo e geram empregos em quantidade suficiente para absorver os que por falta de opção sobrevivem consumindo a riqueza da floresta.

Quem consome a riqueza da floresta "por falta de opção" tem linhas de crédito no Banco do Brasil e sempre que falta dinheiro consegue mais, ameaçando parar as exportações, "estouro so subprime agrícola" etc.

Compreende-se que a defesa da Amazônia exija uma posição protecionista mais rígida. Isso não pode impedir, porém, que ignoremos áreas agrícolas consolidadas há gerações, sem encontrar formas de flexibilização do uso do solo. Ambas as posições são necessárias para alcançarmos o desenvolvimento sustentável que a Amazônia e sua gente merecem.
REINHOLD STEPHANES , 69, economista, deputado federal licenciado (PMDB-PR), é o ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

E um grandissíssimo filho da puta.

2 Comments:

Blogger Silvio Tambara said...

"REINHOLD STEPHANES , 69, economista, deputado federal licenciado (PMDB-PR), é o ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

E um grandissíssimo filho da puta."

É por isso que sou seu fã.

6:33 AM  
Blogger jotacê said...

Why bother?

7:04 AM  

Postar um comentário

<< Home