A flock of doidos

COMO FAZER, nos EUA, um filme cujos personagens são bichos da megafauna do Pleistoceno, onde aquela palavrinha com "e" vira e mexe aparece e sem ofender ninguém no Kansas? A Fox tem uma resposta: faça Ice Age 2. A animação do brasileiro Carlos Saldanha é a prova definitiva de que o conservadorismo religioso do Bible Belt/National Mall pode até ter perdido a batalha de Dover, mas ganhou a guerra cultural americana no lugar que interessa: a indústria do entretenimento.

O filme é inteiro desenvolvido sobre o seguinte argumento: o sertão vai virar mar. A Era do Gelo está acabando por causa do tal aquecimento global (o do Pleistoceno, calma), e o lar dos bichinhos simpáticos como as macrauquênias, dentes-de-sabre, gliptodontes e mamutes vai ser inundado ("flood", em inglês, traduz tanto "inundação" quanto "dilúvio"). Uma tartaruga-profeta meio picareta avisa a bicharada que há um barco a três dias de caminhada dali que pode salvar a pele de todo mundo.

Sim, você já viu essa história antes.

A coisa não pára por aí. A história tem como vilões um mosassauro (who the fuck ordered a mosasaur?) e um Metriorynchus. Que são, ah, bom, do Cretáceo. "Eu não disse, meu filho, que os humanos conviveram com os dinossauros?", apontarão as mamães do Kansas.

Fora a referência menos sutil aos Pearly Gates quando o Scrat "morre" e os paredões de gelo se abrindo e deixando passar uma luz épica, avermelhada. Olha, pode me chamar de paranóico, mas em tempos de dobradinha Bush/Murdoch eu não duvido de mais nada.

Ainda bem que meus filhos não estudam mais nos EUA e podem aproveitar as boas piadas de Ice Age 2 sossegados.