Os veios fechados da América Latina
QUEM DISSE que o sonho acabou? Como este blogueiro prenunciou corretamente meses atrás, o fato de Evo Morales ter colocado na cabeça um gorro tiwanakota de quatro pontas no dia da sua posse era um fato de enorme carga simbólica, que antecipava grandes coisas. Minha aposta era a reconquista do norte do Chile. Mas o aimará presidente fez melhor: nacionalizou os hidrocarbonetos, chutou o saco de meia dúzia de "parceiros comerciais" (leia-se sanguessugas de recursos naturais), inclusive e principalmente o do Brasil, e deu ao país mais pobre do continente um pouquinho de esperança. Como disse Clóvis Rossi hoje na Folha, foi o primeiro ato genuinamente de esquerda no planeta desde a queda do Muro de Berlim.
Viva Evo.
Há séculos o capitalismo tem preparado a Bolívia para ser palco de eventos interessantes (note que eu ainda não usei a palavra com "r"), todos eles relacionados com a geologia espetacular do seu território. Primeiro foi o metalismo espanhol, seguido no século 19 por Simón Patiño e a criminosa exploração do estanho de Potosí. No século 20, foi a vez do petróleo e do gás. No 21, a tentativa de venda de outro recurso geológico vital -- a água -- para uma companhia francesa precipitou a explosão da bomba social em Cochabamba. O lumpesinato boliviano ganhou a parada e gostou: do lado de cima da cordilheira, em El Alto, bloqueios de estradas e protestos populares acabaram derrubando o presidente Goñi Sánchez de Lozada.
Pra ninguém achar que a indiada andou servindo de massa de manobra, diga-se logo que a esquerda boliviana é rachada em pelo menos três setores: o colaboracionista, mais ou menos o que o PT virou no Brasil, o populista-reformista, do qual Morales é o maior expoente, e o terrorista, de Filipe Quispe, que quer refundar o Estado indígena e mandar todo mundo à puta que pariu. Os eventos que culminaram com a eleição do índio Evo e dos intelectuais brancos que lhe dão sustentação são, antes de mais nada, um sinal de esgotamento de uma sociedade que é paupérrima mas ainda não entrou em colapso, como o Haiti e os países da África negra. Antes de se esfacelar numa guerra civil, a Bolívia resolveu dar uma chacoalhada nas coisas.
Claro, tem um componente nada desprezível de showzinho -- ao ver seu ibope subir com o discurso populista, Morales resolveu radicalizar. Mas é besta achar que um presidente (que pode ser bronco, mas que tem muita gente que estudou na Sorbonne por trás dele) arriscaria como Morales arriscou só por showzinho interno.
Agora, uma coisa é peitar a Petrobras. A outra é saber, objetivamente, o que fazer depois disso. Se as múltis saírem todas de uma vez, os bolivianos vão viver do quê? Eles não sabem explorar petróleo e gás natural sozinhos. Claro, esse é o argumento que sempre justificou o saque do Terceiro Mundo, a chantagem da ignorância que todos os séculos de pilhagem não quiseram e/ou não puderam reverter. Evo aposta na interdependência; seu filé e grande demais para as petroleiras largarem así no más.
Veremos quem tem razão. Agora, se a moda pega...
Viva Evo.
Há séculos o capitalismo tem preparado a Bolívia para ser palco de eventos interessantes (note que eu ainda não usei a palavra com "r"), todos eles relacionados com a geologia espetacular do seu território. Primeiro foi o metalismo espanhol, seguido no século 19 por Simón Patiño e a criminosa exploração do estanho de Potosí. No século 20, foi a vez do petróleo e do gás. No 21, a tentativa de venda de outro recurso geológico vital -- a água -- para uma companhia francesa precipitou a explosão da bomba social em Cochabamba. O lumpesinato boliviano ganhou a parada e gostou: do lado de cima da cordilheira, em El Alto, bloqueios de estradas e protestos populares acabaram derrubando o presidente Goñi Sánchez de Lozada.
Pra ninguém achar que a indiada andou servindo de massa de manobra, diga-se logo que a esquerda boliviana é rachada em pelo menos três setores: o colaboracionista, mais ou menos o que o PT virou no Brasil, o populista-reformista, do qual Morales é o maior expoente, e o terrorista, de Filipe Quispe, que quer refundar o Estado indígena e mandar todo mundo à puta que pariu. Os eventos que culminaram com a eleição do índio Evo e dos intelectuais brancos que lhe dão sustentação são, antes de mais nada, um sinal de esgotamento de uma sociedade que é paupérrima mas ainda não entrou em colapso, como o Haiti e os países da África negra. Antes de se esfacelar numa guerra civil, a Bolívia resolveu dar uma chacoalhada nas coisas.
Claro, tem um componente nada desprezível de showzinho -- ao ver seu ibope subir com o discurso populista, Morales resolveu radicalizar. Mas é besta achar que um presidente (que pode ser bronco, mas que tem muita gente que estudou na Sorbonne por trás dele) arriscaria como Morales arriscou só por showzinho interno.
Agora, uma coisa é peitar a Petrobras. A outra é saber, objetivamente, o que fazer depois disso. Se as múltis saírem todas de uma vez, os bolivianos vão viver do quê? Eles não sabem explorar petróleo e gás natural sozinhos. Claro, esse é o argumento que sempre justificou o saque do Terceiro Mundo, a chantagem da ignorância que todos os séculos de pilhagem não quiseram e/ou não puderam reverter. Evo aposta na interdependência; seu filé e grande demais para as petroleiras largarem así no más.
Veremos quem tem razão. Agora, se a moda pega...
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