Quanta besteira
Idéias ruins algumas vezes se recusam a morrer. Veja, por exemplo, o caso da apropriação indébita da mecânica quântica pelos místicos da “nova era”, na década de 1980. Em pleno século 21, ela voltou para nos assombrar, e desta vez bem além dos consultórios de terapeutas de floral. O novo ataque acaba de estrear nos cinemas, sob o título de “What the Bleep Do We Know?” (“Que P... Nós Sabemos?”). Proteja-se.
O filme se propõe, sem modéstia nenhuma, a revelar ao espectador a resposta para a vida, o Universo e tudo o mais. Para isso, entra sem bater no mundo da física subatômica, misturando durante 109 minutos conceitos científicos distorcidos, ensinamentos “filosóficos” suspeitos e cinema de mau gosto.
A mensagem básica do filme é que o Universo é um lugar muito esquisito, e que a realidade em que nós vivemos é apenas a superfície de um mundo vasto e misterioso. Nesse mundo, descortinado ao longo do século passado pela mecânica quântica, tudo é incerto. Partículas podem estar no passado e no futuro ao mesmo tempo, em estados sobrepostos, que se alteram no momento em que alguém as observa.
Acontece que da esfera nanoscópica dos elétrons para o mundo macroscópico dos seres humanos existe um abismo que físico nenhum ousaria saltar. Os diretores de “What the Bleep...”, William Arntz, Betsy Chasse, e Mark Vicente ignoram as placas de “proibido seguir em frente” e propõe que a existência não passa de um produto da nossa mente, uma realidade que “escolhemos” protagonizar dentro de um leque infinito de realidades possíveis. Não existe passado ou futuro, e sim um sem-número de experiências que flutuam juntas, como bolhas de sabão (a metáfora é dos diretores). A mecânica quântica, diz o filme, nos autoriza a saltar livremente entre essas bolhas. Mas, por alguma obscura ilusão à qual nosso cérebro é condicionado, optamos por ficar presos a uma delas.
O filme, uma mistura estranha de ficcção e documentário, gira em torno de Amanda, uma bela fotógrafa surda-muda que trabalha para uma agência de publicidade nos Estados Unidos. Durante o dia, ela vai se defrontando com suas “bolhas quânticas”. Ao mesmo tempo em que entra num cinema sozinha, ela sai de lá sozinha ou de braços dados com seu futuro marido. Viaja para o passado e até se encontra com um índio da época do descobrimento da América (em todas as realidades possíveis, curiosamente, opta por continuar surda).
Para legitimar os percalços de Amanda, os realizadores de “What The Bleep...” escolheram uma série de “especialistas”, cujos depoimentos pontuam a narrativa. Nenhum deles é identificado durante o filme, mas o site oficial (www.whatthebleep.com) traz seus currículos com detalhes (ou requintes de crueldade).
É uma galera medonha. Muitos se dizem físicos, pós-graduados ou professores desta ou daquela grande universidade americana, mas todos optaram por linhas de pesquisa, digamos, não-convencionais, como “criatividade quântica” e “consciência biomolecular”. Gente que não se envergonha de dizer coisas como “a cada manhã eu escolho como será o meu dia” e “cada célula do nosso corpo está sem dúvida viva”. O time é completado por uma “líder espiritual” que se identifica apenas como Ramtha, toneladas de botox no rosto, que compraz em dar aulas de neurociência do sexo ao espectador.
Se estivesse vivo (bem, talvez esteja, em alguma realidade paralela), o físico alemão Werner Heisenberg, que formulou o príncípio da incerteza, receberia o besteirol pseudoquântico desfiado em “What the Bleep Do We Know?” como um castigo por ter participado do programa atômico nazista. Aos mortais comuns, que só dispõem de uma vida e um futuro, resta escolher gastar esses 109 minutos assistindo a um outro filme. Ou lendo um bom livro-texto de física.
O filme se propõe, sem modéstia nenhuma, a revelar ao espectador a resposta para a vida, o Universo e tudo o mais. Para isso, entra sem bater no mundo da física subatômica, misturando durante 109 minutos conceitos científicos distorcidos, ensinamentos “filosóficos” suspeitos e cinema de mau gosto.
A mensagem básica do filme é que o Universo é um lugar muito esquisito, e que a realidade em que nós vivemos é apenas a superfície de um mundo vasto e misterioso. Nesse mundo, descortinado ao longo do século passado pela mecânica quântica, tudo é incerto. Partículas podem estar no passado e no futuro ao mesmo tempo, em estados sobrepostos, que se alteram no momento em que alguém as observa.
Acontece que da esfera nanoscópica dos elétrons para o mundo macroscópico dos seres humanos existe um abismo que físico nenhum ousaria saltar. Os diretores de “What the Bleep...”, William Arntz, Betsy Chasse, e Mark Vicente ignoram as placas de “proibido seguir em frente” e propõe que a existência não passa de um produto da nossa mente, uma realidade que “escolhemos” protagonizar dentro de um leque infinito de realidades possíveis. Não existe passado ou futuro, e sim um sem-número de experiências que flutuam juntas, como bolhas de sabão (a metáfora é dos diretores). A mecânica quântica, diz o filme, nos autoriza a saltar livremente entre essas bolhas. Mas, por alguma obscura ilusão à qual nosso cérebro é condicionado, optamos por ficar presos a uma delas.
O filme, uma mistura estranha de ficcção e documentário, gira em torno de Amanda, uma bela fotógrafa surda-muda que trabalha para uma agência de publicidade nos Estados Unidos. Durante o dia, ela vai se defrontando com suas “bolhas quânticas”. Ao mesmo tempo em que entra num cinema sozinha, ela sai de lá sozinha ou de braços dados com seu futuro marido. Viaja para o passado e até se encontra com um índio da época do descobrimento da América (em todas as realidades possíveis, curiosamente, opta por continuar surda).
Para legitimar os percalços de Amanda, os realizadores de “What The Bleep...” escolheram uma série de “especialistas”, cujos depoimentos pontuam a narrativa. Nenhum deles é identificado durante o filme, mas o site oficial (
É uma galera medonha. Muitos se dizem físicos, pós-graduados ou professores desta ou daquela grande universidade americana, mas todos optaram por linhas de pesquisa, digamos, não-convencionais, como “criatividade quântica” e “consciência biomolecular”. Gente que não se envergonha de dizer coisas como “a cada manhã eu escolho como será o meu dia” e “cada célula do nosso corpo está sem dúvida viva”. O time é completado por uma “líder espiritual” que se identifica apenas como Ramtha, toneladas de botox no rosto, que compraz em dar aulas de neurociência do sexo ao espectador.
Se estivesse vivo (bem, talvez esteja, em alguma realidade paralela), o físico alemão Werner Heisenberg, que formulou o príncípio da incerteza, receberia o besteirol pseudoquântico desfiado em “What the Bleep Do We Know?” como um castigo por ter participado do programa atômico nazista. Aos mortais comuns, que só dispõem de uma vida e um futuro, resta escolher gastar esses 109 minutos assistindo a um outro filme. Ou lendo um bom livro-texto de física.
5 Comments:
A coisa é pior do que parece. Esse pessoal são uma seita bizarra: http://skeptico.blogs.com/skeptico/2005/04/what_the_bleep_.html
Cara, que ducaralho. Esse skeptico realmente deu todo o serviço. Obrigado!! Recomendo a todos a leitura. O cara se deu o trabalho de ver o filme, prestar atenção e demolir a cascata minuto a minuto. Bravo!
Realmente, tem muito louco à solta por aí. Um outro exemplo é David Icke e sua teoria maluca sobre homens-répteis (W seria um deles) e o governo secreto dos Illuminati. Um vídeo dele pode ser visto usando o Winamp. A dicção é excelente (ele foi apresentador da BBC).
Ah, vai dizer que você DUVIDA do governo secreto dos Illuminati?
:-)
Não duvido de mais nada! Ontem, passou um especial sobre o envolvimento do H no assassinato de JFK, e do W, filho do H, na morte do John-John, filho do JFK.
Mas tem coisa boa, como documentários da BBC (assisti a vários, sobre os mais diversos temas: "sombreamento global", o programa nuclear iraniano, segunda guerra mundial, etc.). Agora, esses sobre teorias de conspiração são os melhores. Horas e horas de diversão garantidas ou seu dinheiro de volta.
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